Na noite do último dia 13, sábado, um cozinheiro foi detido pela polícia após fazer o teste do bafômetro na rodovia Engenheiro Constâncio Cintra, com resultado de 1,32 miligrama de álcool por litro de ar expelido pelos pulmões. Ele havia se envolvido em um acidente de carro sem vítimas. Levado ao Plantão Policial, o delegado decidiu que ele poderia pagar um salário mínimo para não ser preso – o que foi feito prontamente pelo embriagado
Horas antes, no mesmo Plantão Policial, sob a análise de outro delegado, um vendedor de 22 anos foi detido pela polícia também por embriaguez ao volante. O resultado do bafômetro apontava 0,41 miligrama de álcool. O rapaz era reincidente e também carregava uma pequena porção de cocaína. Ele assumiu ter bebido antes de dirigir o veículo.
O delegado conferiu a ele a possibilidade de pagar fiança, mas dessa vez em 30 salários mínimos. Sem o dinheiro – pouco mais de R$ 20 mil – ele foi levado à cadeia.
Em situações como essas, é o delegado de plantão e responsável pelo distrito policial quem analisa o caso para dar ao detido a fiança adequada. Em Jundiaí, a maior parte dos casos vai de um a três salários mínimos, mas já ocorreram situações em que o motorista pagou 100 salários mínimos para se ver livre das grades.
A defensora pública Rosely Galvão Mota diz que as fianças devem sempre ser proporcionais à condição financeira de quem é detido pela polícia em uma situação de embriaguez ao volante. A comunicação de motoristas presos pelo delito é comum na Defensoria Pública – que atende pessoas de baixa renda e sem condições de pagar pelos serviços de um advogado. Apenas em maio deste ano chegaram nove casos às mãos de Rosely. No mês seguinte, mais cinco. “O que fazemos é pedir ao juiz para dar a liberdade ao preso ou diminuir o valor da fiança”, conta a defensora.
De acordo com Rosely, na maior parte dos casos o detido não será preso quando sua sentença final for dada. Por isso, diz ela, não há muito sentido em mantê-lo preso antes. “Mesmo em casos de alguém que recebe a fiança de um salário mínimo, existem pessoas com baixas condições que não podem pagar e ficam presas”, relata ela, que não acha a lei severa, mas acredita que ela tem de ser cumprida adequadamente – com a palavrinha-chave que a defensora utiliza com frequência: razoabilidade.
Isso leva Rosely a outro ponto de sua análise, sempre ancorada em leis. Ela explica que o delegado, ao arbitrar a fiança, deve utilizar critérios objetivos – ligados àquilo que diz a lei, que vai de um a 20 salários mínimos – e subjetivos, que dependem da análise das condições financeiras do embriagado e seus antecedentes, o que pode fazer a fiança passar de 20 salários mínimos. No trabalho, Rosely já se deparou com casos em que o embriagado teve que pagar até 60 salários mínimos. Nesse caso, a questão subjetiva falou mais alto.
REGRAS E EXAGEROS
O delegado Hamilton de Souza, titular do 4º Distrito Policial, diz que as condições financeiras do detido sempre são levadas em conta e que só há flagrante e possível prisão caso se confirme, por meio do bafômetro, que o motorista realmente estava embriagado. Caso ele não aceite fazer o bafômetro, mas aceite tem seu sangue colhido para exames, ele não será preso naquele momento, pois o exame não fica pronto na hora.
Segundo Hamilton, o pagamento feito pelo motorista embriagado tem de ser em dinheiro e ele nunca viu casos em que cheques foram aceitos – tampouco o veículo do detido dado como garantia de pagamento. “Tem que ser dinheiro mesmo”, declara.
Professor do Centro de Estudos Avançados de Trânsito e membro efetivo da Comissão de Trânsito da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de São Paulo, o advogado Rosan Jesiel Coimbra considera severa a nova Lei Seca, que pune em igual medida quem bebeu uma garrafa de vinho ou uma taça de vinho, quem cometeu uma imprudência em uma região com grande circulação de pessoas – e, por isso, com mais chances de causar uma morte – e aquele que estava próximo a um canavial, a certa altura da madrugada, com seu veículo.
Os exemplos citados acima são do próprio advogado, que vê uma violação da garantia constitucional da individualização e da proporcionalidade. “Não se leva em conta a circunstância dos fatos”, argumenta.
Rosan, nos últimos meses, tem percebido uma mudança de comportamento naqueles que não abrem mão dos golinhos a mais e do volante. O advogado explica que as pessoas continuam a beber, mas estão em bares mais próximos de suas casas. Ao que parece, o adeus à boa e velha cervejinha ainda está longe de ocorrer.
Rafael Amaral, do JJ Regional.